quarta-feira, 7 de julho de 2010

Uma noite fantástica por um mundinho fantástico





Acabo de voltar do Santander Cultural, onde rolava uma sessão de um filme parte da VI edição do Fantaspoa - Festival Intenacional de Cinema Fantástico de Porto Alegre. Pra quem não tem a mínima ideia do que é isso, a parte do "Fantástico" se refere à filmes de conteúdo fantasioso e pura ficção. Ficção todo filme é, mas nesse caso é algo realmente extrapolante. A grande maioria das películas em exibição até domingo dia 18/07 são obras de terror, suspense, ficção cietífica, fantasias quase surreais ou coisa parecida.

Quem quer saber mais e ver a programação, http://www.fantaspoa.com/2010/index.php



Agora vamos à tal sessão. Devo dizer que foi a primeira da história do festival que eu fui e também a primeira vez que vou ver um filme no Santander Cultural. À primeira vista, já me surpreendi pelo ambiente mais "bem acabado" e pela quantidade de cadeiras. Geralmente esses cinemas de "filme arte" e etcs são pequenos, de espaço ruim e qualidade da imagem e som ruins. Não é o caso aqui, que tinha um número de assentos maior e a projeção do filme, feita direta de DVD, estava muito boa.
Outro detalhe, não só me surpreendi com quantos assentos tinha como também com a quantidade de gente que foi. Na boa, não esperava quase ninguém e vi uma boa quantidade de gente disposta a ir num cinema fora de uma shopping, menor e com filmes mais do lado B, numa quarta-feira à noite.

O filme da vez era "Uma Noite na Cidade", de título original e impronunciável em tcheco. A direção e co-roteirização é do Jan Balej, que escreveu o filme junto do Ivan Arsenjev. Produção de Viktor Mayer, música de Tadeas Vercak, design de som do Zbynek Mader e fotografia de Miloslav Spála.


Citei os nomes de todos esses envolvidos não só porque consta no site do festival, mas porque todas essas partes do todo foram feitas com maestria. Música, fotografia, direção de arte, direção, efeitos sonoros e o roteiro, todos casam perfeitos entre si para contar a história de forma magnífica. Claro, a direção de arte do mini-mundo dos bonecos animados, as suas animaçãoes e o roteiro merecem um destaque à mais. Porra, é impressionante a criatividade das diferentes situações e personagens do longa. Mesmo ele sendo separado em três segmentos que pouco tem a ver um com o outro, fora o estilo, narrativa e estética, é um filme perfeitamente apreciado por uma criança de 5 anos e um senior aposentado.


A história é dividade entre 3 partes, a 1ª e a 3ª compreendendo personagens que se cruzam de longe entre si e a 2ª parte, a mais surreal de todas, composta por dois personagens muito bem construídos e peculiares. Tanta desconexão não chega a incomodar, pois a cada momento focamos numa história que é interessante e dá variedade à obra. Se trata de uma animação em stop-motion (aquela da Fuga das Galinhas e Estranho Mundo de Jack, com bonequinhos que são milimétricamente mexidos e fotografados a cada mexida para no fim eles parecerem terem vida própria). Os bonecos eu acho que são de madeira com peças articulas, com formas bem caricatas e engraçadas. Destaque pra um gato feito com latão (igual aos de assar churrasquinho de gato, hehehe) e o rosto é só uma parte de uma fotografia de uma pin-up.

Não quero estragar nada, porque todas histórias são muito inusitadas e fodásticamente criativas. O máximo que posso falar é como boa parte das histórias lida com as loucuras e bizarrieces humanas de forma muito cômica e interessante.

O outro grande lance e certo diferencial do filme é que ele simplesmente não tem diálogo. Porém, ele está longe de ser um filme mudo. Os personagens até dialogam, mas são somente grunhidos enrolados que não formam língua nenhuma (por mais que a língua tcheca deva ser estranho pra cacete). Dessa forma, mesmo sendo da República Tcheca, é perfeitamente inteligível para qualquer um.
O ponto importante do filme e sua sonoridade são os efeitos sonoros. Eles dão toda a vida para as ações dos personagens, tornando aqueles bonecos inanimados em seres mais próximos de possuir carne e osso. Some aí a música fantástica e se tem algo que daria pra imaginar Chaplin fazendo hoje, se estivesse vivo.

Todos esses elementos curiosos não fazem de Uma Noite na Cidade uma punheta de "arte pela arte" ou algo pretensioso demais. Sim, eu não sei se vi coisa parecida, portanto ele sem dúvidas é inovador. Mas mais do que isso, a capacidade de manter o público atento às diferentes histórias surreais é o arroz-com-feijão do filme. Posso exagerar no lance de criança de 5 anos, que não entenderá algumas insinuações sexuais e podem se traumatizar com a única cena com sangue(só que é sangue de massinha de modelar!) do filme, mas boa parte é compreensível pelas mais diversas pessoas em diferentes idades e divertindo-as na mesma proporção.

Realmente, é fantástico.

domingo, 13 de junho de 2010

Bafana, bafana!




Como falei aluguei também esse fim de semana o filme "Mandela - Luta Pela Liberdade", ou Goodbye Bafana, no original. Aproveitando a Copa na África do Sul pra entender mais do país.

Já escrevi sobre o Invictus, filme do Clint Eastwood que retrata a época presidencial do Mandela durante a Copa do Mundo de Rúgbi, mas esse outro filme sobre a história de Nelson é muito mais abrangente que o Invictus. Além do mais, ele também é muito interessante e menos óbvio, pois o protagonista não é o dito cujo, e sim um dos carcereiros de Mandela quando ele esteve no presídio de Rhode Island.
Um carcereiro branco, um homem comum que acreditava nas mentiras do governo, como o suposto plano de extermínio que os negros tramavam contra os brancos. Ele não só muda sua visão de mundo ao longo do filme, como mostra que fazer parte do “sistema” pode ser uma forma de acabar com as injustiças dentro dele.
A história real é tirada do livro Goodbye Bafana, livro de memórias do carcereiro do Mandela. Dirigido sem firulas pelo francês Bille August (já adaptou A Casa dos Espíritos pro cinema) , Dennis Haysbert (já antes de Obama,o primeiro presidente negro americano David Palmer, do 24 Horas) interpreta um convincente Mandela, que vai sendo desenvolvido em 3ª pessoa de maneira formidável. Não chega ao nível de excelência e precisão do Morgan Freeman como Mandela no filme Invictus, mas é muito bom. Já a Diane Kruger (a Helena de Tróia e atriz alemã e espiã do Bastardos Inglórios) e o Joseph Fiennes (Shakespeare Apaixonado, Círculo de Fogo, Lutero), ambos perfeitos.
Muito além dos filmes, a vida desse sujeito é incrível. Ao mesmo tempo que a ditadura do Aparthaied foi muito mais fudida que a nossa ditadura brazuca, a reconciliação democrática era muito mais complicada e funcionou de forma muito mais espetacularmente bem. Na real, me faltam palavras pra falar sobre o assunto. O cara não é o santo pacifista que muitos pensam (e o filme faz questão de mostrar isso) e nem por isso ele é menos digno de elogios. Certamente, haviam muitas coisas pra dar errado, e muitas deram certo, contra todas espectativas. Dá muita esperança de viver e acreditar que muita merda pode melhorar. Recomendo esse filme pra todo mundo.

Chapa nos peito, chute na mente e tiro no coração. Nada mais relaxante pra um fim de domingo...




Aluguei esse fim de semana três filmes: Goodbye Bafana(Mandela - Luta pela Liberdade), Busca Implacável (Taken) e O Sol de Cada Manhã (The Weather Man).

Nesse instante terminei de assistir o Busca Implacável. Ele é notavelmente perfeito em todos aspectos técnicos. A direção (Pierre Morel, fotógrafo de "Cão de Briga") é digna de um filme do Bourne, com lutas corpo-a-corpo muito foda e um ritmo implacável (ahn, ahn, entenderam o trocadilho?). Sua 1hr e 30 min passam como se fossem 15 minutos, o que para um ação/suspense é a marca de qualidade na minha opinião.

Fora isso, o roteiro (de Robert Mark Kamen e Luc Besson , escritores de O Quinto Elemento, O Profissional, Nikita, Joana Darc, Karete Kid, Artur e os Minimoys, Carga Explosiva, Taxi, Bandidas e Cão de Briga) é um típico suspense de ação de agente secreto, o único diferencial talvez seja o cenário parisiense. No geral, a história tá mais pra 24 Horas que um filme do Bourne. A CIA não é inimiga de ninguém, foi ela que deu habilidades para o protagonista (interpretado pelo Liam Neeson, um ator com uma persona artística do típico agente fodão, mas interessantemente com aspecto bem mais velho que a média desses personagens) salvar sua filha. A premissa do roteiro é, digamos, retrógrada, visto que o inimigo é um ser externo ao universo dos personagens "bons". Um tanto de xenofobia com albaneses, no caso desse filme. Mas não creio que a intenção do filme deva ser a de fazer alguma politicagem. É um mero recurso do filme. Só me incomoda que um pai que quer impedir a filha de viajar para Paris porque "eu conheço o mundo e sei como ele é perigoso" parece o tipo de coisa que meu pai diria. E um filme desses serve pra reforçar esse tipo de visão do mundo. Mais estranho ainda, o protagonista parece encarar os EUA como o lugar mais seguro do mundo, coisa da qual eu duvido muito.

Agora, pra defender um pouco, tem gente que vai achar o filme repleto de violência escapista. E é. O ponto positivo é que ele não é o filme que trata de violência e não mostra ela diretamente (apesar de que poderiam ter usado mais bolsas de sangue). Uma cena de tortura bem visceral e outra em que ele atira em uma mulher eu vejo de certa forma como uma coragem cinematográfica. Se fosse só mais um produtinho, seria um filme mais "limpo". Ponto positivo.

No fim, é um filme bom pra se passar o tempo. Nada edificante, nada inovador. Não obstante, é bem feito e violentamente catártico. É só manter uma visão crítica e dar o play.

quinta-feira, 3 de junho de 2010

Escritos ao vento




Um sorriso sacana surgiu no meu rosto quando eu coloquei os olhos sobre o cartaz de papelão do filme O Escritor Fantasma. Na parte de cima estava escrito "Do polêmico diretor Roman Polanski". Hehe, polêmico pelos filmes ele pode ser, mas os marketeiros não escolheram hora pior pra designar esse adjetivo para esse polaco fugido. Até porque, Polanski terminou de editar o filme em casa, já que estava preso pelo suposto crime de "embebedação de menor e sexo logo em seguida".
Que ele fez, é bem provável, mas a própria ex-menor (o crime data dos anos 70) fala que não houve nada. Ela pode estar encobrindo e admitir um estupro é algo muito mais complicado do que o óbvio. Há inúmeros casos de mulheres que retiram a queixa contra o estuprador mesmo ele tendo realmente violentado-as. Dito isso, acho que a grande questão é que o acontecimento caducou há muito e não é uma prisão domiciliar que fará Roman ter mais culpa da consciência do que ele pode ter.

Dito isso, vamos ao que interessa: o filme. Ele é muito calcado no roteiro , como todo suspense, e fora o início meio truncado e silencioso, a trama inteira é conduzido de maneira excelente de forma a criar uma atmosfera tensa e paranóica. Fotografia escura e pálida ajudou muito + direção precisa + atuações fodas.

A história toda é uma crítica indireta ao governo do Tony Blair. O tal escritor-fantasma (Ewan McGregor) se envolve numa trama de intrigas muito maior do que ele poderia esperar quando é contratado para escrever as memórias de um ex-primeiro ministra britânico (o bom 007, Pierce Brosnam).

O roteiro (baseado no livro The Ghost, de Robert Harris, e adaptado por Polanski e Harris)se sustenta muito em alguns poucos personagens. Dessa forma, Polanski tirou o máximo do Ewan McGregor (melhor atuação dele que eu assisti)e da mulher do primeiro-ministro, Olivia Williams (esposa do Bruce Willis no Sexto Sentido). Ao invés de ir num caminho óbvio de mostrar muito uma relação entre o primeiro-ministro e o escritor, esse último acaba mais em contato com a primeira-dama, que nunca se sabe se defende o marido ou está contra ele. Além deles, há o sempre ótimo Tom Wilkinson como destaque. O caminho vai gradativamente ficando tortuoso e claustrofóbico.

Música à moda antiga muito boa do Alexander Desplat (novo nome da trilha sonora mundial, só nesse último Oscar tinham 4 filmes com trilha dele - Julie & Julia, O Fantástico Senhor Raposo, Um Profeta e Coco Antes de Chanel) e utilizada de maneira econômica. Há vários segmentos de diálogo sem música nenhuma, o que acaba sendo muito bom e não cria aquela poluição sonora que muitos suspenses políticos possuem. Um certo minimalismo muito bem aplicado.

É um filme político, que traça um retrato dos jogos do poder atual. De certa forma, é o dito fim do partidarismo, já que o Partido Trabalhista britânico, assim como o PT aqui no Brasil, mostram como jogam o mesmo jogo sujo dos outros que eles cirticam.
Seguindo nessa de que os opostos tem mais em comum do que aparentam, dou destaque pra uma parte muito boa filme:

O primeiro-ministro vai ser julgado por uma comissão internacional de direitos humanos e pergunta pros seus assessores o que ele pode fazer. Nisso eles respondem:

- Podemos permanecer aqui nos EUA, que não aprova a comissão internacional e assim não pode ser investigada.

- E que outras opções temos? Que outros países não seguem também?

- Ah, tem uns na África, tem a Indonésia, China, Coréia do Norte, Irã e Iraque.

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E pra encerrar, há outra passagem do filme muito boa, em que se auto-ironiza o papel social de mudança do próprio filme. O escritor, meio sem saída, fala para um investigador:

- Tu sabe muito bem que estamos nos esforçando muito e colocando nossos pescoços à prêmio, sendo que tudo vai acabar em pizza e ele vai ter uma aposentadoria confortável da CIA?


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Pois é, um filme não muda o mundo, mas pode mudar e influenciar algumas coisas menores, mas não menos importantes. O poder de registro, ficcional e histórico, do audiovisual é que valem muito.

A luta continua!

sábado, 8 de maio de 2010

The Long Winding Road...




Fim de semana passada fui assistir A Estrada, filme que não tá muito bombado na mídia, mas faz um tempo que esperava depois de saber da produção dele descrita em alguma contra-capa do Segunda Caderno da ZH. E valeu a pena.

Na minha lista de filmes, esse fica já como o melhor filme do pós-oscar. Tudo é muito bem feito, numa história nem tão nova, mas profunda e pesada. Pesado é um adjetivo que cabe muito bem a esse filme. Na boa pessoal, não é pra relaxar no fim de semana. Se possível, assistam na última sessão de domingo, só pra aumentar aquele sentimento de "o dia de amanhã é uma merda mesmo". Filme com cenas bem pesadas, seja em violência, tristeza ou miséria.

O cenário é um mundo pós-apocalíptico, em que obviamente tudo está destruído. As regras da sociedade que todo mundo considerava muito imutáveis tem uma reviravolta tremenda. Um Mad Max bem sério. Ou a versão menos hollywoodiana do recente O Livro de Eli.

O roteiro é uma adaptação de um livro do Cormac McCarthy, que também escreveu o livro que deu origem à Onde os Fracos Não Tem Vez. Aliás, acho infinitamente melhor a história apresentada aqui, mas não vou debater se gosto ou não do filme dos irmãos Coen que abocanhou um monte de oscars.

Essa história é simplesmente foda demais. Muitas situações extremas com que os poucos seres humanos precisam lidar pra sobreviver. E quase sempre a lei básica da Natureza de "cuide de seu cú, que os outros não farão isso por você" parece imperar. E aí que vem a pergunta, não são justamente os humanos que são um pouco mais do que esses instintos selvagens? A premissa dramática do filme é essa: até que ponto podemos manter nossa civilização, se ela nem existe mais?

Pesado e profundo em muitos momentos, a atmosfera foi muito bem criada. Cenários cinzas, desolados. Direção, direção de arte, fotografia e música casando muito bem, nenhuma se sobrepondo a outra. Direção de fotografia do Javier Aguirres, que fez também Fale com Ela, Vicky Cristina Barcelona, Os Fantasmas de Goya, Os Outros, Eric Clapton & Friends. Trilha sonora do Warren Ellis, que fez O Libertino, junto com o Nick Cave, músico do Nick Cave & The Bad Seeds, que trabalhou no "Assassinato de Jesse James Pelo Covarde Robert Ford" também junto do Warren Ellis. O diretor, John Hill Coat, tem uma amizade das antigas com o Nick Cave, que inclusive escreveu um filme que ele dirigiu, The Proposition.


Entre os rostos conhecidos temos a Charlize Theron como coadjuvante e o Viggo Mortensen (desde 2002, o eterno Aragorn do Senhor dos Anéis), com uma aparência irreconhecível. O guri Kodi Smit-McPhee é que é a surpresa e mata muito a pau. Completamente agoniante ver um personagem que nem sabe como é a nossa realidade pré-apocalíptica e ainda sempre se sentir perdido no mundo que habita. E tem momentos brilhantes como os momentos que ele traz uma humanidade que os adultos parecem já ter perdido.

Bom, o filme é muito foda.


P.S.:

Pra quem assistiu ou for assistir, a minha maior pergunta seria: na mesma situação tu faria o mesmo ou desistiria de viver de uma vez? Pra mim, acho que tu depende de quem tu tem do teu lado (como um filho). Se fosse sozinho, preferiria morrer logo.

http://www.youtube.com/watch?v=lpmvW2ii-PU&hd=1

http://www.imdb.com/title/tt0898367/

http://en.wikipedia.org/wiki/The_Road_(film)

terça-feira, 4 de maio de 2010

O Pós-Fordismo, A Publicidade, A Tecnologia e a Bonanza





Ando meio desligado e meio revoltado. Não me perguntem como cheguei ao ponto de discutir comigo mesmo os efeitos nocivos do sistema de produção pós-fordista e minha indignação na maneira como as propagandas (das quais provavelmente farei parte da produçã) exaltam aspectos completamente inúteis de produtos que se dizem "novos" sendo que são iguais às suas versões "antigas".

Digam-me, existe uma enorme diferença tecnológica entre o modelo de Fiat Punto 2009 e 2010. Ou entre as roupas que eram moda no outono do ano passado e do outono desse ano? Pra minha concepção, um novo modelo de produto só deveria ser desaguado no mercado se ele representa uma utilidade superior em relação ao seu modelo anterior. Um computador, um celular, um tv, um videogame, isso tudo eu entendo e aceito. Há visivelmente uma diferença tecnológica de bom tamanho entre um modelo e outro. Já num carro, acho irrisório. Precisamos mesmo de um modelo 2011, sendo que 2010 nem terminou? Tem alguma mudança no sistema de segurança? Tem um consumo mais eficiente de combustível? A última propaganda que eu consigo me lembrar que falava-se num carro com avanço tecnológico substancial foi no lançamento dos carros com motor flex. E de lá pra cá, alguma propaganda enumera as diferenças que fazem valer a pena trocar um modelo de carro pelo outro? Um faról com design mais arredondado faz tanta diferença assim?

E no maravilhoso mundo da moda, digam-me porque eu devo me vestir de acordo com o que um estilista Y pensou que é a nova moda? As pessoas não deveriam criar a moda de maneira natural e espontânea? Elas não tem capacidade pra isso, um bundão tem que inventar isso pra elas? Acho que fenômenos culturais deveriam influenciar a indústria da moda depois que algum evento, etc crie nas pessoas a vontade de se vestir de uma determinada forma, copiando um personagem de alguma obra artística ou uma personalidade/artista. Isso ocorre, mas mesmo antes de se lançar Alice no País da Maravilhas, boa parte das cadeias de lojas de roupa de shoppings decidiram implantar uma moda baseada no filme (nem sei até que ponto se basearam de verdade ou só se usaram do nome pra pegar carona).

A cada ano que passa, se fala em uma roupa que aqueça mais no inverno e tenha transpiração melhor no verão? É o mesmo caso do carro, não existe mudança tecnológica que justifique a sobreposição de uma roupa desse ano sobre a roupa do ano passado.

Fico puto, acho uma "falta de sacanagem" o sistema de produção pós-fordista forçar esse consumo descerebrado. E nós (pelo menos no meu caso, que sou estudante de Publicidade e Propaganda) em certa(ou boa) parte ajudamos a perpetuação dessa merda toda. É ótimo podermos ter opções de escolher outras cores de carro, e não um modelo T preto da Ford, mas tudo vem com um custo. Esse troca-troca constante de mercadorias que não tem motivo para serem substituídas umas pelas outras me leva a crer que é só aquele velho desejo humano pela ganância. O tipo de mentalidade "eu tenho o último modelo de carro, olhem pra mim! Com certeza meu pau agora é muito maior que o de vocês, otários!" que de maneira geral fode a sociedade num plano tanto moral quanto econômico. Estamos faturando afú, mas um dia essa festa vai terminar.

Não sei o que acho que vai mudar com esse e-mail, nem eu larguei do curso de Propaganda (ainda) nem ninguém provavelmente vai fazê-lo, mas é sempre bom cutucar a consciência e quem sabe repensar certas coisas dessa vidinha bandida. Ao menos, pense duas vezes antes de elogiar um novo modelo de carro ou de bolsa.
É isso, boa noite.

domingo, 2 de maio de 2010

Ferro reforçado







Se eu definiria Alice no País das Maravilhas como uma bela bosta (um filme de merda que é embelezado à ponto de ser posto na prateleira como algo atraente), eu defino Homem de Ferro 2 como um blockbuster tão afudê que consegue colocar robôs lutando no corpo-à-corpo e com armas de fogo num cenário com bambus, roda d'água e pétalas de cerejeira voando ao vento. Poético? Por favor, não. É um bela homenagem otaku/nerd/cinéfila e como disse, é muito massa.

Essa continuação é melhor que o primeiro Homem de Ferro. Se o primeiro era um filme-pipoca com as virtudes de ser um filme de super-herói não querer se levar à sério e ter um roteiro ótimo para a composição dos personagens principais que eram muito bem interpretados, esse segundo filme tem personagens ainda mais bem construídos e uma trama bem bolada pra justificar uma cena como aquela descrita no primeiro parágrafo.
Os problemas do primeiro filme eram essencialmente no desenvolver do seu roteiro. O seu início era ótimo (já ao som de AC/DC) e muito bem adaptado para a contemporaneidade, só que o resto da história acabava enchendo linguiça e deixava de ter o mínimo de conteúdo interessante o suficiente pra prender o público nas suas cadeiras. A reviravolta era apresentada meio cedo demais e além disso, o vilão era muito fraquinho.

Aqui nós temos vilões à altura. E o mais legal é que eles não se enquadram só como os super-vilões. Sam Rockwell faz um empresário bem pé no saco e funcional. E claro, temos o já ressuscitado-do-necrotério-de Hollywood, Mickey Rourke, que fala até em russo e fica com um palito de dentes de caminhoneiro e a maravilhosa com jeitinho de vadia contida, Scarlett Johansson. Eles aparecem até menos do que eu imaginava, mas isso não foi um defeito.
O roteirista do Trovão Tropical, Justin Theroux, entrega uma história muito bacana e com os diálogos maravilhosos de Tony Stark. Como o Stan Lee queria fazer quando criou a HQ, ele nos faz gostar de um herói que tá mais pra anti-herói. O narcisismo do personagem gera momentos muito arriados. A decisão de deixar um roteirista fazer todo o trabalho funcionou melhor do que o trabalho à 8 mãos do roteiro do 1º filme.

Pra quem gosta de analisar roteiro um pouco mais a fundo, ele tem alguns defeitos. Mal se falava na unidade especial S.H.I.E.LD. e no pai do Tony Stark no 1º filme, e aqui ambos tem peso na história e na resolução de uns problemas que o Homem de Ferro encara. Erro, mas nada comprometedor.

Falar do Robert Downey Jr é meio redundante. O papel foi feito pra ele. A Gwyneth Paltrow segue fazendo uma Pepper Potts muito massa. Junto com o Tony Stark, ela era a melhor personagem no 1º filme e continua firme. O Don Cheadle substitui o Terrence Howard com competência. E a participação do Samuel L. Jacksson vale a pena.

A música é uma bela pauleira com AC/DC e The Clash muito bem usados. E a música composta teve ajuda do Tom Morello, guitarrista do Audioslave e Rage Against the Machine. Não tem erro.

Jon Fraveau tem uma direção precisa em todos os momentos e pôde explorar mais nessa continuação. Diferente de um Michael Bay, ele sabe aproveitar os (muito perfeitos) efeitos especiais. Ah, e sem 3-D falso.

Vamos a análise sociológica do filme. Ele quer dizer alguma coisa? Na real, fiquei confuso. No fim das contas não ficou claro se eles apoiam o militarismo privado ou estatal, porque todos lados fazem cagada. Como o protagonista é um felizardo sonhador americano de sucesso, acaba havendo uma defesa da propriedade privada. Além dessas questões mais dúbias, uma coisa fica clara. Homem de Ferro trabalha para e pelos americanos acima dos outros. E ele é a nova bomba nuclear que deve estar do lado dos justos e bravos, impedindo que as ameaças em potencial ataquem os EUA com medo de uma retaliação muito pior.
A retórica de paz mundial através da barganha e competição militar funcionaram de forma falhada durante a Guerra Fria toda, não há porque acreditar nela agora. Tony Stark tem um sorriso encantador, mas ele mesmo acaba falhando na sua ideia. O tal desenvolvimento tecnologico milagroso que vai salvar o mundo acaba fazendo mais armas que "tijolos para hospitais"(fala do 1º filme).

No fim das contas, é óbvio que um blockbuster americano com uma história que respinga no militarismo e política vai deixar a vista a ideologia do status-quo, etc. A questão é que, como eu falei antes, é um filme que não se leva muito a sério e por isso mesmo que é legal. Esqueça um pouco do mal que Jack Bauer e seus asseclas podem estar causando ao mundo e relaxe. Eu não diria que é um filme de ação, é um filme de aventura, como todo bom super-herói deveria ser (menos os Batmans recentes). Enquanto que Homens-Aranha e X-Men tentam ter um certo nível de seriedade e eventos épicos e acabam descambando, Iron Man só melhora.

Ah, e pra quem manja um pouco de personagens de quadrinhos, a cena depois dos créditos vale a pena. Um cliffhanger, como os gringos chamam, um gancho muito bom para um dos próximos filmes da Marvel Productions. Aliás, a decisão da Marvel fazer as suas adaptações de seus quadrinhos me parece até o momento ótima. Se mantiverem a qualidade e o espírito dos Homens de Ferro, que venham mais uns quantos.