sexta-feira, 16 de julho de 2010

Um pouco do meu DNA memético

Tudo começou com Jurassic Park. Só a possibilidade de ver dinossauros gigantescos caminhando era algo completamente fantástico. A questão da “fábrica de sonhos” e da “magia do cinema” começaram a se cristalizar a partir daquele momento em que se revelava um “pescoçudo” de 33 metros da altura se alimentando de eucaliptos. Pois bem, ali se plantou a sementinha do mal, mas ainda não no sentido completamente compreendido como uma paixão pelo audiovisual ficcional. Foi mais uma paixão pelo que ele mostrou, à época, que eram criaturas das quais só se tinha noção em fotos de fósseis e se imaginava como teriam vivido, andado, se alimentado, etc. Só alguns anos atrás que percebi como foi ali que, perdoando qualquer conotação homossexual, Steven Spielbergh me fez perder meu cabaço cinematográfico. Ainda assim, eu era mais um aspirante à paleontólogo do que cineasta.
Após essa nossa primeira vez, só podia esperar por mais. E essa veio, mas não diretamente desse judeu queridinho de Hollywood sentado na sua cadeira com os dizeres “Director” atrás, e sim de uma “mera” produção executiva. E essa produção executiva era o MIB. E olha que, mesmo não tendo nenhuma autoria sobre a obra, esse filme tem mais um dos temas recorrentes de Spielbergh, além de velociraptors ou tubarões, que são os alienígenas. Como a propaganda da Globo dizia com muita alegria “de Steven Spielbergh”, pra mim não teve erro, fui ver bem alegre. E ainda por muito tempo achei que era tudo saído daquela cabeça nerd com um boné do ET. E sim, ET’s foi o outro elemento fantástico que me fascinou. Ok, o Will Smith era engraçado o filme inteiro e chamava o ET vilão de “baratão”, mas a falta de seriedade (em relação ao Jurassic Park) não chegou a afetar a credibilidade, por assim dizer. Aliás, foi até pior do que os dinossauros. Veja bem, uma coisa é uma criança esperar por um futuro próximo onde cientistas conseguiriam clonar dinossauros e fazer um parque temático (algo que sigo esperando), outra coisas é a possibilidade de vida fora do planeta Terra estar infiltrada entre nós. Cara, isso é outro nível! Conspiração o suficiente pra abismar qualquer infante. Os alienígenas estavam entre nós, sem dúvida.
Toda essa paranóia só se agravou com o desenho. Aliás, pra ser bem sincero, não lembro até hoje se assisti primeiro ao desenho no Cartoon Network, ou ao filme que o Steven produziu. Mesmo com todo o lance da propaganda da Globo ecoando no meu cérebro e me atraindo para ver uma outra obra supostamente do mesmo cara que mostrou dinos “reais”, não descarto a possibilidade de que o meu vício infantil (TV ligada no Cartoon Network todo dia) pode ter-me feito assistir ao desenho primeiro. Porque mais forte que a propaganda da Globo ecoando, é a lembrança de quando descobri que o desenho foi feito depois do filme, o que sempre achei o oposto. Então, sigo com essa dúvida amargando minha consciência.
Pois bem, o desenho. E que desenho! Ele era muito mais sombrio, apavorante e paranóico que o filme! Filme que era pra “gente grande” também ver e que tem gente real. Desenho, que é pra criança sem discernimento do mundo, era muito mais crível que o filme, que era pura comédia escrachada. Nada pior que cada episódio o narrador enunciar:
- MIB, Homens de Preto. Episódio de hoje: “A síndrome de ...”

Caralho! Que diabos é o significado de “síndrome”!? Como uma criança feliz vai saber isso? Então, talvez já vem daí o meu futuro apreço pela loucura e afins. Esse desenho me gerou, com certeza, uma síndrome.
Para piorar ainda mais a situação, logo veio um “genérico” do desenho do MIB, “Os Mixtérios de Roswell” (com aquele “x” porque o locutor não escondia seu carioquês). Bom, aí fudeu tudo. Aliens não só existiam como eram as origens de todos outros relatos míticos, como bruxas, lobisomens, zumbis... O estrago estava feito. Benzadeus que na época eu não tive contato com Arquivo X, se não estava cursando jornalismo pra escrever pra revista UFO (será que realmente precisa de diploma pra escrever nela?)
Os filmes de et’s de Spielbergh, que propriamente o lançaram como o “diretor alienígena”, Contatos Imediatos de 3º Grau e ET, só fui ver muito depois. Mas enfim, Steven Spielbergh era o primeiro nome de cineasta que meu cérebro wikipédico armazenou na memória. Alguns anos depois, toda a febre pelo sujeito voltaria de maneira gloriosa, dessa vez sem ET’s nem brontosauros, mas com uma história muito mais real. Tão real que, pelo menos o seu cenário, era real. Ou melhor, foi real. Falo-lhes da 2ª Guerra Mundial e como Hollywood foi para o combate (e voltou a fazer um filme de guerra que chama se a atenção do mundo) com O Resgate do Soldado Ryan. A febre foi tão grande, mas paradoxalmente foi o último título a filmografia Spielberghiana que me chamou a atenção e também o título que me fez de certa forma desgostá-lo anos depois.
Eu e meus amigos nerds tínhamos encontrado outro tópico de discussão que não fossem extra-terrestres, (não posso me esquecer que na época que vi O Resgate do Soldado Ryan foi anos depois do lançamento no cinema, até porque em 98 eu não tinha nem a pau idade pra poder ver tripas estendidas nas areias de Omaha Beach) até porque “Sinais” era o filme do momento (aliás, meu filme favorito com aliens). Agora poderíamos falar de assuntos realmente relevantes como História e Política (lá se vai a paleontologia e a biologia). Como na época do MIB, outros elementos se agregaram para aumentar ainda mais o meu zietgeist pessoal do momento: era o jogo Medal of Honor. Eu podia ser completamente descordenado tentando dar tiros com uma Mosin Nagant com um mouse, mas foi com certeza uma experiência sem iguais. Enquanto a febre das lan-houses se inicia com os nerds mais patéticos jogando RPGS e a pirralhada genericamente chata matando a si mesma no Couter-Strike (“Que jogo imbecil” era meu pensamento na época) nós nos deliciávamos com as tecnologias arcaicas dos anos 40 e com a atmosfera de tragédia humana que pairava nas eternas nuvens cinzas dos cenários do jogo.
Mais adianta, haveria mais uma pedra no meio desse rio que viria a ser tornar o rival de Medal of Honor nos jogos de tiros de primeira pessoa, chamado Call of Duty. Naquele momento, não só eu e meus comparsas nos inclinávamos menos ao lado dos americanos quanto deveríamos estar inclinados (seria uma raiva em relação a Guerra do Iraque que se iniciava? E ainda assim, a guerra americana contra os nazistas nós apoiávamos...), aí me vem esse jogo muito mais elaborado e de proporções épicas que coloca o jogador na visão não só de um soldado americano, como de um britânico (“Hmmm, parecem mais boa gente”) e de um russo (“Caralho! Esses caras são muito fodidos e fodas!”). O brilho do Dia D começava a se desgastar em relação à heróica resistência russa em Stalingrado. O meu filme de segunda guerra favorito passava a ser Círculo de Fogo. Antes a suástica e a águia pareciam um símbolo assustador de poder, mas agora encontrava na foice e no martelo numa bandeira vermelho sangue um símbolo de força que não fez campos de concentração para incinerar corpos de narigudos do clã Spielbergh. E com a minha professora de geografia falando que no comunismo todo mundo ganharia pelo menos um casaco, poxa, aqueles barbudos bigodudos devem ser muito legais.
Como Winston Churchill (que entre todos líderes da 2ª Guerra acabou prevalecendo para mim até hoje como o melhor ou “menos pior”) dizia “Quem não foi comunista até antes dos 20 anos não tem coração.” Que foi o meu caso. Depois eu entendi a segunda parte da citação que seguia com “E quem segue sendo comunista depois dos 30 não tem cérebro.” É, depois de ler 1984, meu livro favorito, no fim do 1º ano do ensino médio, já dá pra desmistificar vários elementos da utopia comunista. Acho que desde então que eu e o Cazuza estamos procurando uma ideologia pra viver. E não é Marina Silva que me convence de ser um verde.
O que me fica muito dessa época é o interesse em política, história e videogames. A parte de história e política ainda se repetiria na imersão em mais um filme da época, analisando outro Reich, mas aquele controlado por Júlio César. “Gladiador” foi outro marco importante, de forma que mesmo podendo hoje observar todos os exageros e erros históricos típicos dos épicos, não posso deixar de amar O Último Samurai ou God of War.
Voltando ao fator cinema, sem esquecer a política, e ainda por cima juntando dessa vez a biologia, co-irmã da paleontologia dos dinos, vou a uma das maiores influências minhas até hoje. Antes de 1984, antes de me tornar um cinéfilo. Falo de mais um videogame (sim, minha nerdice é incurável), a obra-prima definitiva que mudou tudo: Metal Gear Solid. Talvez o mais próximo de um filme interativo. Mesmo com seus personagens gimmick e kitsch ao estilo quadrinhos, desenho animado e filmes b exploitation, era o mais impressionante roteiro que eu já tinha visto se desenrolar diante dos olhos (e em alguns momentos com o controle na mão efetivamente fazendo alguma coisa). Cara, o jogo tem mais tempo de animações e diálogos de rádio do que um épico de 2hrs40min.
Nunca mais me sai da cabeça as diferentes frases e expressões de cada personagem. As dublagens, mais afudês que muitas atuações por aí, constantemente me afloram e me fazem repetir falas com imitações melhores do que as de Sílvio Santos. E o mais curioso foi que Hideo Kojima, o primeiro nome de um criador de um jogo que tornou-se popular, me ensinou mais sobre cinema do que eu conseguia entender assistindo um filme. Já que os elementos narrativos, lingüísticos e estéticos do cinema estavam se apresentando em outro meio, ficaram mais fáceis de se delinear. Sou eternamente grato a esse sujeito. Mudou meu jeito de ver a vida humana inteira, graças a quantidade de Teoria do Gene Egoísta que ele carregava e explicitava. Se eu já tinha uma mente meio de biólogo desde Jurassic Park, aqui dói a aplicação filosófica à vida em geral. Com tantas teorias e conspirações governamentais, criando em mim um senso crítico em relação a quase tudo que carrego até hoje, e juntamente com a linguagem cinematográfica aplicada a uma obra audiovisual interativa digital, os memes do meu cérebro nunca mais foram os mesmos (e se eu estou usando a palavra meme é por causa das ideias e teorias contidas no Metal Gear Solid 2 Sons of Liberty).
O vício chegou a estender-se até a marca de cigarro que eu fumava (“Só Lucky Strikes, porque é o que o Snake fuma no Metal Gear 2 do MSX”) até ano passado. E sabem do pior? Ainda não joguei o Metal Gear Solid 4. Quando terminá-lo 3 vezes fazendo tudo, posso morrer feliz.


Ainda tem Quentin Tarantino e como usar referências de filme ruins pra fazer um filme verossímel e bom (e influenciando todo um respeito pelos exploitation e principalmente os Spaghetti Western e filmes de gênero italiano e criando outro culto, que se chama Clint Eastwod {junto com Solid Snake e Jack Bauer, o exemplo de macho alpha que inconscientemente todo homem precisa}) e toda a cinefilia que tomaria conta de mim definitivamente a partir do 1º ano do ensino médio, 24 Horas com o seu agente do governo em uma trama tensa (ecos de Solid Snake), Lost e sua ficção científica (com um final nem tão científica assim) ampliando horizontes de cenário (sem futurismo ou cenário urbano) e de nível dramático (sim o final é ruim, mas chorei bastante na hora do adeus), e até o recente The Office (me alegra muito na vida e é um reflexo do cotidiano muito bem feito, com personagens que me identifico (trama amoroso de Jim e Pam) e outros que fazem coisas ruins, mas sem querer e que às vezes fazem o bem, além de muita sinceridade: “Eu não quero um puxa-saco que seja assim porque pode ascender na vida dessa forma, eu quero um puxa-saco que seja assim por realmente me amar.” Enfim, um reflexo da vida, do jeito das pessoas e como temos que aturá-las com seus jeitos e também um reflexo das contradições da vida.)

Sei lá, usei muitos parênteses e quero sair do PC agora. Outro dia me aprofundo mais e segui para o próximo capítulo de minhas memórias meméticas. Vou assistir Navajo Joe agora.

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