sábado, 31 de outubro de 2009

Alçando vôo






Épico. Filme de ação. Artes Marciais. O que tudo isso têm em comum? Não se encaixam de jeito nenhum nos estilos de cinema feitos no Brasil. Isso, é claro, até o aparecimento de "Besouro".

Besouro é um filme que se passa nos anos 20 no Recôncavo Bahiano. O cadomblé era oprimido e a capoeira proibida. Mesmo depois de 40 anos sem escravidão, os negros continuavam a ser igualmente tratados como escravos. Esse é o contexto do filme. Ufa, ainda bem, tem discussão de problemas sociais. É ainda um legítimo filme brasileiro. O resto dos ingredientes pra esse acarajé fílmico é que deixam o prato interessante.

Alguém já imaginou ter um filme de capoeira coreografado por um mestre chinês de artes marciais? Então, tá aqui o que você queria! O nome desse onorável oriental é Huan-Chiu Ku. Nada mais nada menos que dublê de Jet Li e coreógrafo de lutas de filmes como Kill Bill e O Tigre e o Dragão. No mínimo foda. E é mesmo. Ver um filme nacional com esse estilo e toda essa perfeição na categoria é maravilhoso.

Passado essa colaboração inusitada, vamos aos outros aspectos do filme. Direção de João Daniel Tikhomiroff. Who the fuck is João Daniel Tikhomiroff?! Esse cara não é um novato. Ele dirigiu filme antes. Em 72! E era isso. Como ele veio à tona depois de tanto tempo, não faço a mínima ideia. O que se sabe é que ele não ganhou 48 Leões em Cannes por premiações publicitárias.
Caralho, o cara é demais. Planos e cenas absolutamente lindos e muito perfeitos. E ter uma mentalidade voltada para rodar um filme de ação num país considerado sem verba pra esse tipo de "luxo" é uma vitória ainda maior.

A reconstituição de época é muito convincente. Direção de arte do Cláudio Amaral Peixoto. Esse é mais conhecido que o diretor. Esteve em produções como "Última Parada - 174", "Meu Nome Não É Johnny", "Guerra de Canudos" e "Cazuza - O Tempo Não Para."
A fotografia é tão linda e perfeita como a direção. Obra do também internacional Enrique Chediak. Equatoriano em processo de radicamento para o Brasil, Enrique faz um baita esforço pra ter uma fotografia estilosa e nem perceptivelmente exagerada.

Na trilha sonora consta Gilberto Gil e Nação Zumbi. E toda música instrumental é muito boa.

Ah, a preparação de elenco é da Fátima Toledo, famosa por Pixote - A Lei do Mais Fraco, Cidade Baixa, Central do Brasil, Cidade de Deus e Tropa de Elite. Aliás, quase ninguém tinha noção do que era uma preparação de elenco até o surgimento da Fátima no cinema brasileiro.

O roteiro segue uma linha com alguns clichês, mas recobre o filme com momentos suficientemente bons e significativos para fazer a história valer a pena. O filme trata da cultura negra, da exploração do homem pelo homem, da perseguição religiosa e de costumes. Muito mais do que filme "social" ou filme onde o embate é só na base da porrada, há momentos esperituais bastante inesperados. A pessoa sai do cinema com alguma divindade do candomblé na cabeça.

Acho que o filme é muito bom. Artísticamente e monetariamente. Não só isso, também tenho fé de que ele vai ser um momento histórico. Todo dinheiro da Petrobrás, Siderúrgica Nacional e da Odebrecht(o filme é quase um produção lulista) valeram a pena. Uma ruptura de gêneros, de alguns paradigmas e ransos dos rolos já quase envelhecidos do chamado "cinema nacional".



"Um besouro é pesado. Não foi feito pra voar. E ainda assim voa."

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